
Desde o Império, a diplomacia brasileira tem se consolidado e marcado presença na ordem mundial. Alinhado aos interesses dos "aliados" nas duas grandes guerras e ao Ocidente na Guerra Fria, o Brasil soube preservar personalidade própria nas relações internacionais e alguma autonomia em relação às potências. Mesmo durante o regime militar e em plena Guerra Fria, com alinhamento político e militar aos Estados Unidos, o Brasil não deixou de ter gestos importantes de soberania e de não obediência automática aos interesses da superpotência: a extensão da soberania sobre as 200 milhas no Atlântico, o acordo nuclear Brasil-Alemanha e outras atitudes confrontaram interesses norte-americanos. Também, mesmo nesse período, não consentiu com o estabelecimento de bases militares estrangeiras em seu território, fato somente admitido excepcionalmente durante a Segunda Grande Guerra.
No comércio internacional, o Brasil vem acentuando pragmatismo nas relações, sem levar em conta posições políticas de cada parceiro. A criação do Mercosul foi passo significativo para que o país não estivesse mais de costas aos seus vizinhos e aprofundasse a política de integração na América do Sul. Após a Constituição de 1988, o Brasil, por sua posição na Organização das Nações Unidas e fóruns internacionais, passou a ter uma posição bem mais autônoma e não alinhada a interesses de potências. Igualmente aumentou suas relações Sul-Sul, ou seja, com as nações em desenvolvimento do hemisfério meridional. Para muitos, em anos mais recentes, exagerou na solidariedade a regimes ditos de esquerda, mesmo aqueles com formas pouco democráticas de governo.
Estamos agora a caminho de radical mudança na postura diplomática. Tanto falas do futuro chefe da nação, como textos, ideias e declarações do anunciado chanceler apontam alinhamento incondicional aos interesses norte-americanos, abandono da postura de neutralidade no Oriente Médio, certo desprezo ao Mercosul e à integração latino-americana e contágio ideológico da diplomacia que superará em muito os excessos dos governos petistas. Nossos interesses econômicos e comerciais serão atingidos seriamente por essa postura nas relações internacionais. E apesar de ter sido dito que o comércio seria independente de ideologias. Até se fala na possibilidade de uma base militar estadunidense em território brasileiro. Enfim, a ingenuidade ideológica não é monopólio de alguns ramos da esquerda. Na direita pululam posições ingênuas, capazes de sacrificar os interesses nacionais por purismos ideológicos.
E isto num mundo multilateral no qual a principal potência tem um governo que abandona teses liberais da globalização e insiste em defender com garras e brigas a supremacia dos seus interesses nacionais, denunciando tratados, confrontando aliados e desprezando a ideologia de blocos e globalização. Que haja um lampejo de pragmatismo no futuro governo brasileiro, antes que seja tarde